segunda-feira, 17 de maio de 2010

8) - As Camadas da Neurose e a Atualização do Potencial Amoroso

O indivíduo com distúrbios de contato e dificuldades para o amor precisa desenvolver seu potencial amoroso, o indivíduo necessita romper a evitação e confrontar os medos subjacentes que a mantêm, cristalizando comportamentos e atitudes que não favorecem o livre fluxo do crescimento individual e relacional.
Baseando-se na teoria de Fritz Perls sobre as camadas da neurose, vamos refletir sobre o papel do medo, no bloqueio da capacidade para o amor. Obviamente, as "camadas" são referencias meramente teóricas que facilitam a compreensão, pelo terapeuta, do processo do cliente. Aponto, a seguir, algumas características desse processo, e suas possíveis correlações com a atualização de sua capacidade amorosa do cliente.
Perls descreveu cinco camadas da neurose que impedem o contato do indivíduo com a própria autenticidade: postiça, fóbica, impasse, implosiva e explosiva.
É importante enfatizar que o processo de retomada do crescimento faz com que a pessoa possa transitar pelas diversas camadas, sem que haja, necessariamente, uma sequencia de fluxo, ou seja, o indivíduo pode experimentar seus medos, voltar a desempenhar papéis, manifestar-se autenticamente, e "retornar" à primeira camada.

  1. A primeira camada da neurose é denominada camada postiça. As pessoas que permanecem nessa camada utilizam-se constantemente de papéis, de jogos de controle, para tentar ser o que não são. Comportam-se "como se" fossem: vítimas, controladas, seguras, fortes, injustiçadas, inteligentes, altruístas, etc. São atitudes baseadas num conceito, numa imagem ou fantasia, que fazem de si mesmas. Não vivem autenticamente e cristalizam-se nesses papéis diante do outro, sem revelar nem a elas próprias quem são. O indivíduo que permanece nessa camada estabelece, com frequencia, o jogo do dominador-dominado, interna e externamente. Através dos jogos de controle, evita confrontar os próprios medos e angústias, responsabilizando os outros por suas dificuldades. Manipula as pessoas para que se comportem de maneira complementar, de modo a reforçar a evitação e não ter que se deparar consigo mesmo. O reconhecimento da falsidade desses jogos leva ao desprazer, dor, sofrimento, angústia, desespero, e é justamente a relutância em aceitar essas sensações e sentimentos desagradáveis que serve de passagem à camada seguinte.
  2. A segunda camada da neurose é denominada fóbica. Esse modo de ser envolve o contato com os medos que mantêm os comportamentos postiços. A atitude fóbica é ter medo de ser o que somos na realidade. Quando o indivíduo torna-se cônscio de seus papéis e manipulações, passa a entrar em contato com os próprios medos. Nos relacionamentos afetivos, em geral esses medos se caracterizam como medo da solidão, da rejeição ou de abandono, além do medo da perda do controle (se entregar). A grande maioria dos clientes tem fantasias "catastróficas" de que se forem o que são, se disserem o que pensam ou sentem, serão repudiados, agredidos, violados, ou abandonados. O momento em que o cliente se depara com os próprios medos é geralmente vivenciado com muito sofrimento e angústia, já que está "despido" das formas de proteção obsoletas usadas até então. Nesse momento, para que o cliente possa vivenciar os medos e a dor e manifestar as fantasias de "destruição", ele precisa contar com o amparo inicial do terapeuta, que o acolhe, mas sem "poupá-lo". Esses medos mantêm a atitude de distanciamento da parte do cliente em relação a outras pessoas, já que ele necessita dos mecanismos de autoproteção que se manifestam através de papéis e jogos. Dessa forma, os medos não são resolvidos, apenas camuflados. Assim, as necessidades de proteção e segurança permanecem sempre prioritárias na hierarquia de necessidades da pessoa, o que impede que ela estabeleça relacionamentos de entrega plena.
  3. A terceira camada da neurose é o impasse, e ocorre quando o indivíduo não está pronto ou disposto a usar os próprios recursos para estabelecer um contato ou uma fuga genuínos. Na camada do impasse o cliente toma consciência do que não é. Isso gera um sentimento de não se estar vivo de que não se é nada. O impasse é o estar encalhado, paralisado nem exteriorizando, nem não exteriorizando. Se o cliente tomar consciência do impasse, o impasse desmoronará e ficaremos livres dele. Quando o indivíduo libertar-se do impasse, depara-se com a sensação ou o medo da "morte".
  4. Essa experiência caracteriza a quarta camada, a chamada implosiva, onde as energias necessárias à vida estão bloqueadas e investidas inutilmente. Nessa camada o cliente vive uma espécie de paralisia catatônica, o cliente se contrai, se comprime, se implode. A implosão ocorre pelo receio da explosão. No entanto o contato com esse medo pode ser o início da explosão. A mínima exteriorização, um leve tremor ja é o começo da dissolução da camada implosiva. Só a "morte" da falsa auto-imagem fabricada, fundada em medos, em dor e desespero possibilita o amadurecimento, a atualização da individualidade, um verdadeiro renascimento, que se dá através da explosão. Na quarta camada, a implosão torna-se explosão. Na camada explosiva, as energiasque não foram utilizadas anteriormente são liberadas atrav~es da alegria, da dor, da cólera, ou orgasmo. Perls considera um indivíduo completo aquele que é capaz de explodir dessas quatro maneiras. Talvez, ao ser capaz de liberar alegria, dor, cólera e orgasmo, ele possa vivenciar o amor, estando pronto para ver a si e o outro, encontrar-se com o diferente, entregar-se à vida e às relações de maneira plena e intensa.

Em minha próxima postagem falarei sobre o amor terapêutico, que é a principal ferramenta do psicoterapeuta.

Nenhum comentário: